Depois de Marcelo, país enfrenta a corrida presidencial mais aberta em 40 anos

Sem Marcelo na disputa e com múltiplos candidatos competitivos, as presidenciais surgem como altamente imprevisíveis, com forte probabilidade de uma segunda volta, um cenário registado apenas em 1986.
Agência Lusa
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08 dez. 2025, 10:36

Mesa de voto durante eleições
Fotografia: Paulo Novais/Lusa

Um número recorde de candidatos apoiados por partidos e o facto de um independente, sem experiência política, estar entre os favoritos segundo as sondagens, tornam as eleições presidenciais de janeiro particularmente imprevisíveis e entre as mais concorridas de sempre.

Depois de 10 anos com Marcelo Rebelo de Sousa na Presidência da República, que conseguiu sempre ser eleito à primeira volta, a larga distância do segundo classificado, as eleições presidenciais deste ano já se começam a desenhar como particularmente imprevisíveis e com forte probabilidade de passarem a uma segunda volta, o que aconteceu uma única vez na história da democracia portuguesa, em 1986.

Sem o incumbente na corrida, estas presidenciais estão desde já em vias de se tornar nas mais concorridas de sempre, ultrapassando o recorde registado em 2016, quando houve 10 candidatos.

A pouco mais de um mês das eleições, há já mais de 40 pré-candidatos anunciados, número que deverá reduzir-se significativamente, tendo em conta que cada candidatura terá ainda de ser validada pelo Tribunal Constitucional e necessita das assinaturas de pelo menos 7.500 cidadãos eleitores.

No entanto, mesmo caso o número de candidatos possa ser significativamente inferior, há já uma novidade nestas eleições presidenciais: há sete candidatos que receberam o apoio formal de um partido com assento parlamentar, o que é inédito na história da democracia portuguesa. Até ao momento, o número mais elevado tinha-se registado em 2021, quando houve cinco candidatos com apoios partidários.

Desta vez, estão nessa situação Luís Marques Mendes, ex-presidente do PSD, André Ventura, líder do Chega, António José Seguro, ex-secretário-geral do PS, João Cotrim Figueiredo, ex-presidente da IL, Catarina Martins, ex-coordenadora do BE, António Filipe, ex-deputado do PCP e Jorge Pires, atual deputado do Livre.

O número recorde de candidatos com apoios de partidos explica-se pelo facto de, desde 2019, nunca ter havido tantas forças políticas na Assembleia da República – são atualmente dez –, sendo que praticamente todas, com exceção de CDS-PP, PAN e JPP, optaram por declarar apoio a um dos seus antigos ou atuais militantes. No caso do PS, é a primeira vez que isso acontece desde 2011.

Num contexto de forte fragmentação política, em que o Chega ascendeu a segunda força parlamentar nas últimas legislativas, quebrando com o tradicional bipartidarismo da política portuguesa, a profusão de candidatos e o facto de quase todos os partidos terem investido nesta batalha presidencial já tornava estas eleições particularmente imprevisíveis e disputadas.

No entanto, a essa circunstância, acresce ainda o facto de, segundo as sondagens, um dos principais favoritos na corrida ser um independente, sem qualquer experiência política: Henrique Gouveia e Melo, ex-chefe do Estado-Maior da Armada, que coordenou o processo de vacinação contra a covid-19, em 2021.

A fazer uma campanha que insiste na tónica da ausência de ligação partidária – a mensagem dos seus cartazes eleitorais é “o meu partido é Portugal” –, Gouveia e Melo granjeou apoios de personalidades políticas de vários quadrantes políticos, como o ex-líder do PSD Rui Rio (seu mandatário nacional), o ex-presidente do CDS-PP Francisco Rodrigues dos Santos e até o ex-primeiro-ministro do PS José Sócrates.

Assim, quarenta anos depois de o país ter ido pela primeira e única vez votar na segunda volta de umas eleições presidenciais, esse cenário volta assim a afigurar-se como altamente provável, traduzindo, também neste sufrágio, a crescente polarização da vida política nacional.