Estação do TGV em Gaia em risco de fracassar caso não seja em Santo Ovídio, diz especialista
O especialista em transportes e mobilidade Diogo Magalhães previu que, caso a estação ferroviária de alta velocidade de Gaia seja deslocalizada de Santo Ovídio, como sempre esteve previsto, para Vilar do Paraíso, se transforme num "elefante branco".
Durante um debate 'online' organizado pelo movimento Gaia Verde na quinta-feira à noite, o especialista, com mais de 20 anos de experiência em Madrid, Paris, Sydney e Berlim, considerou que a possibilidade de se mudar a localização de Santo Ovídio para Vilar do Paraíso "é uma solução que vai criar, na prática, um 'elefante branco'".
"Fico perplexo com esta decisão, que vai ao arrepio do Plano Ferroviário Nacional, ao arrepio de tudo aquilo que nos foi vendido durante todo o processo, e para mais uma solução claramente degradada do ponto de vista dos transportes e da mobilidade", considerou.
Em causa está o facto de o consórcio AVAN Norte (Mota-Engil, Teixeira Duarte, Alves Ribeiro, Casais, Conduril e Gabriel Couto) ter assinado, em 29 de julho, um contrato de concessão que prevê a estação de Gaia em Santo Ovídio, prevista desde 2022 e com ligação a duas linhas de metro, apresentando depois proposta para uma estação em Vilar do Paraíso.
Diogo Magalhães antevê que a deslocalização da estação tenha "muito pouca procura de longo prazo, com acessos muito maus e exclusivamente - ou quase exclusivamente - baseados no transporte rodoviário individual, que é precisamente o contrário daquilo que se pretende" ao construir uma linha ferroviária para retirar carros da estrada.
Vincando que o que está em causa não é a pertinência da linha de alta velocidade Porto-Lisboa ou a existência de uma estação em Gaia, Diogo Magalhães deu o exemplo de Barcelona, que está a construir uma segunda estação para receber este tipo de serviços ferroviários, de Berlim, que tem várias estações com serviços deste tipo, ou mesmo Lisboa, que tem a Gare do Oriente e Santa Apolónia servidas por serviços de longo curso.
"O que nós observamos em cidades do resto da Europa de dimensão semelhante e, sobretudo, nas grandes cidades europeias, é que no comboio de alta velocidade os serviços são desenhados de forma a servir áreas metropolitanas em vários pontos. O interesse é precisamente distribuir os tráfegos em toda a região e não apenas no seu ponto central, porque vive muita gente num perímetro muito grande, e quanto mais possibilidades oferecermos aos passageiros, melhor", sustentou.
Adicionalmente, recomendou às autoridades portuguesas que olhem para Espanha, que "anda nisto há muito tempo, e no início viu-se confrontada com dilemas semelhantes nalgumas localidades", evitando cometer os mesmos erros do país vizinho, com estações que supostamente deveriam servir cidades com procura potencial elevada, mas que, por estarem longe do centro das cidades, ficam agora vazias.
"Não é boa ideia construir estações afastadas dos núcleos urbanos", defendeu, lembrando que em casos como as cidades de Huesca e Guadalajara, "que têm, em si, uma população suficiente para justificar um volume de passageiros muito maior, mas porque têm a estação localizada a vários quilómetros de distância, numa zona onde não há acesso de transporte público, acabaram por ficar durante anos isoladas" com "estações 'fantasma'", descreveu, com apenas "dezenas de passageiros por dia".
Forma-se assim um "ciclo vicioso", pois "se não há pessoas, os operadores decidem não fazer paragem lá, e como os operadores decidem não fazer paragem lá há poucos comboios, menos frequência e menos pessoas".
O especialista alertou ainda para o facto da construção da extensão da linha de Metro do Porto não estar garantida na proposta do consórcio AVAN Norte, sendo "um prolongamento que nunca esteve nos planos da Metro do Porto".
"Certamente que se esta [linha] se vier a fazer, será em detrimento de outra qualquer. Espero que não seja Gondomar a pagar o preço desta opção, ou Matosinhos ou a Maia", aventou.