Greve Geral: "Há um país real a expressar-se contra o país ilusório do Governo"

O sociólogo Renato Carmo considera que o novo pacote laboral do Governo aprofunda a precariedade do emprego, sobretudo para os jovens, e critica a desregulação do tempo de trabalho. Saiba o que está em causa.
Filipe Caetano Editor
Vítor Quental
Vítor Quental Jornalista
11 dez. 2025, 13:19

O novo pacote laboral apresentado pelo Governo gerou uma onda de contestação que culminou na Greve Geral. Para Renato Carmo, professor do ISCTE e Diretor do Observatório das Desigualdades, em entrevista ao Conta Lá, o paradoxo reside em precarizar o trabalho num momento de elevado nível de emprego no país. 

O sociólogo salienta que, apesar da alta taxa de emprego, grande parte do trabalho criado é precário e afeta particularmente grupos como os jovens e os imigrantes. Neste sentido, critica as medidas que, em vez de combaterem esta realidade, a aprofundam, como o alargamento do prazo máximo dos contratos a termo. 

"Não consigo perceber como é que se avança de facto com este tipo de propostas que afetam particularmente os jovens," refere Renato Carmo, destacando a contradição entre a intenção declarada de melhorar a vida dos jovens e as propostas apresentadas, que perpetuam a incerteza e dificultam o acesso a um vínculo permanente. 

Outro ponto de crítica forte é a desregulação do tempo de trabalho, nomeadamente através da facilitação do outsourcing e do recurso ao banco de horas individual. Segundo Carmo, estas medidas constituem "uma forte limitação ao tempo, à vivência do tempo, as pessoas terem controlo sobre o seu próprio tempo." Num contexto de vida quotidiana já acelerado, a maior imprevisibilidade laboral torna a vida "muito difícil e, nalguns casos, infernal." 

A proposta política e a contestação 

Renato Carmo frisa ainda que o pacote laboral não foi um tema central nas últimas eleições, o que gerou um sentimento de descontentamento e de "dissonância" na população. A greve geral é vista pelo sociólogo como um sinal importante de um "país real" que se expressa face a uma ideia ilusória que tem sido construída na esfera governativa: 

"A greve demonstra, de facto, que há um país real que se está a expressar. E está a expressar-se de uma forma bastante significativa. E um país, de certa maneira, ilusório que foi construído [...] ao nível da esfera governativa." 

O Professor do ISCTE espera que esta contestação leve o Governo a confrontar-se com a realidade e a "recomeçar esse processo, mas num sentido não de precarizar o trabalho, mas, pelo contrário [...] de tornar o trabalho, sobretudo o emprego, com mais qualidade.